Nascido na Guiné-Bissau, aonde, após o 25 de Abril, foi proibido de regressar, o militar que se destacou na Guerra Colonial foi vítima de covid-19.
Morreu nesta quinta-feira, aos 80 anos, o tenente-coronel Marcelino da Mata, um dos militares da Guerra Colonial mais condecorados. Segundo fonte oficial do Exército, o militar morreu no Hospital Fernando Fonseca (Amadora-Sintra), vítima de covid-19.
Marcelino da Mata, natural da Guiné-Bissau, foi um dos fundadores dos comandos, tropa de elite na qual serviu desde o início da Guerra Colonial, em 1961, e na qual foi progredindo de soldado até oficial, tendo sido promovido em 2018 a major, estando graduado em tenente-coronel.
No Verão de 2018, quando se discutiu a última promoção a major, o presidente da Associação 25 de Abril, Vasco Lourenço, insurgiu-se contra tal possibilidade, afirmando, em artigo no PÚBLICO, que Marcelino da Mata, cometera “crimes de guerra” na Guiné, com “especial relevo” no ataque a Conacri (Operação Mar Verde).
O coronel Matos Gomes, que cumpriu parte do seu serviço militar com Marcelino da Mata na Guiné, entre 1972 e 1974, recorda o seu camarada de armas como um homem “de grande coragem, um combatente muito competente, agressivo e inteligente”. Capitão de Abril, Matos Gomes lembra que o militar agora falecido tinha a seu cargo o comando de um grupo de operações especiais “diversificadas e irregulares no interior da Guiné e nos países limítrofes”.
A mais conhecida foi a denominada Operação Mar Verde, comandada por Alpoim Calvão, que passou pela invasão da Guiné Conacri. Matos Gomes diz que essa missão tinha três objectivos principais: “Derrubar o presidente da Guiné Conacri, Sékou Touré, com a ajuda de forças locais; prender e eliminar Amílcar Cabral [líder do PAIGC e exilado naquele país]; e libertar cerca 40 militares portugueses presos.”
“Marcelino da Mata só conseguiu o terceiro objectivo, libertar os prisioneiros, mas a operação foi um grande sucesso”, lembra o capitão de Abril. Esta e outras das cerca de 2000 missões de combate que cumpriu valeram-lhe várias condecorações, como a de cavaleiro da Antiga e Muito Nobre Ordem Militar da Torre e Espada, do Valor, Lealdade e Mérito.
Após o 25 de Abril de 1974 e do fim da Guerra Colonial, foi proibido de voltar à sua terra natal, entretanto independente. “Não poder voltar foi sempre um dos grandes desgostos da sua vida”, lembra Matos Gomes.
Durante o PREC (Processo Revolucionário Em Curso), “chegou a ser sequestrado e torturado por elementos do MRPP, tendo que se retirar da vida publica durante uns tempos”, afirma o capitão de Abril. Na Primavera de 1975, Marcelino da Mata foi detido e torturado por militares e civis ligados ao MRPP no quartel do Regimento de Artilharia de Lisboa (Ralis). Esteve exilado, em Espanha, até ao 25 de Novembro de 1975.
“Marcelino da Mata soube sempre de que lado estava e porque estava: sempre se considerou português e eu também o considerei sempre assim”, acrescenta Matos Gomes.
Este militar lembra ainda duas curiosidades sobre Marcelino da Mata: “Odiava andar de avião e entrou para os comandos, porque o seu irmão não podia ir, e foi ele.” Marcelino da Mata reformou-se em 1980 e foi responsável pela segurança da Universidade Moderna, encerrada em 2008.
(Jornal Público - Luciano Alvarez - 11 de Fevereiro de 2021)
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